A cena é sempre parecida: blindados entrando na comunidade, helicóptero em órbita, operadores de preto, fuzil longo, escudos e muita pressão política e midiática. Para quem vê de fora, parece tudo a mesma polícia. Mas não é. No Rio de Janeiro, duas forças de elite atuam no mesmo terreno — o BOPE, da Polícia Militar, e a CORE, da Polícia Civil — e isso não é desperdício nem vaidade institucional. É desenho de Estado para um território extremamente hostil.
Neste post vamos destrinchar o que o documentário mostrou: por que existem duas forças de alto risco no mesmo estado, como elas nasceram, o que cada uma faz e por que a operação de 28 de outubro de 2025 consolidou esse modelo. Vou deixar ao longo do texto alguns links oficiais e de referência para você aprofundar.
Contexto: quando o policiamento comum não dá mais conta
O Rio viveu, entre as décadas de 1970 e 1990, um processo diferente da maioria dos estados brasileiros: facções armadas passaram a controlar comunidades inteiras, com armas longas, rotas de fuga por mata e forte domínio territorial. A patrulha convencional não conseguia entrar sem colocar em risco a própria tropa e a população.
Em cenários assim, o Estado cria unidades separadas, com seleção mais dura, treinamento contínuo e liberdade para operar onde há maior risco. É aí que surgem:
A CORE (Coordenadoria de Recursos Especiais) da Polícia Civil, originalmente derivada de estruturas criadas ainda no antigo estado da Guanabara para apoiar operações complexas, com foco em dar segurança à investigação e ao cumprimento de mandados.
Referência institucional: Polícia Civil do RJ
O BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais) da PMERJ, que nasce como destacamento de operações especiais e, com o tempo, vira o símbolo brasileiro de combate em área conflagrada.
Info institucional: PMERJ
O ponto-chave: uma nasce para garantir que a investigação consiga chegar ao alvo; a outra nasce para enfrentar o crime armado que ocupa território. Mesmo palco, funções diferentes.
Duas portas de entrada do Estado

Vamos separar por função, porque isso ajuda quem está estudando segurança pública ou produzindo conteúdo sobre o tema.
CORE: o braço tático da investigação
A CORE existe para que a Polícia Civil consiga entrar em área de altíssimo risco e cumprir a finalidade típica da Civil: prender liderança, cumprir mandado, apreender arma, proteger uma equipe de delegacia. Por isso a unidade trabalha com:
progressão com blindados (Caveirões da Civil);
entrada coordenada com delegacia responsável pelo inquérito;
contrassniper e tiro de precisão;
antibomba;
resgate em área de confronto.
Operações como Jacarezinho (6/5/2021) e a ação na Vila Cruzeiro/Penha (2022) mostraram isso com clareza: a Civil tinha alvos definidos e a CORE foi o elemento que “abriu caminho” para que o mandado fosse cumprido, mesmo em área dominada.
Para relembrar o caso Jacarezinho e o debate que ele provocou, vale consultar a cobertura da época no g1 e também decisões posteriores do STF sobre operações em comunidades.
BOPE: o símbolo do controle de território
O BOPE tem outra lógica: ele sustenta presença, rompe barricada, protege o avanço de outras unidades da PM e consegue operar em favelas com relevo extremamente desfavorável. O fato de o batalhão ter fixado sua sede no alto da Tavares Bastos não é detalhe – é doutrina. Treinar onde o morro acontece permitiu criar técnicas de:
entrada em viela e escadaria;
tiro de cima para baixo;
evacuação em encosta;
emprego de blindado e apoio aéreo.
Reportagens antigas e estudos de segurança citam que, após a instalação do BOPE na Tavares Bastos, a área ficou anos sem homicídios — um efeito bem didático de presença permanente do Estado. Um bom material para quem estuda ocupação de comunidades é o que a própria PMERJ já publicou sobre as UPPs e operações especiais; alguns resumos podem ser encontrados no portal do Governo do Estado do Rio
A operação de 28 de outubro de 2025: o “laboratório” de guerra urbana

Nessa ação, o que se viu foi emprego conjunto: a CORE na linha de frente, unidades da PM fechando cerco e o chamado “muro do BOPE” — uma barreira humana e tática montada na área de mata para impedir que traficantes escapassem pela rota já conhecida. Isso tirou o confronto do meio da comunidade e empurrou para a área de vegetação, reduzindo o risco para moradores.
Por que isso importa para este post?
Mostra que as duas tropas não competem; elas se complementam.
Demonstra que o Estado precisa, às vezes, de uma tropa civil (para garantir a legalidade da investigação) e de uma tropa militar (para sustentar o combate).
Reforça a tese de que o Rio não tem duas tropas de elite por vaidade, mas por necessidade operacional.
Para quem quer comparar esse tipo de operação com padrões internacionais de intervenção, vale olhar relatórios de organismos de direitos humanos e também manuais de operações especiais que ficam disponíveis em sites como o da ONU ou da OEA, que tratam de uso progressivo da força.
“Mas quantos eles têm?” — o mistério do efetivo
Outra parte do documentário que rende conteúdo é a discussão sobre efetivo. Nem CORE nem BOPE divulgam abertamente o número de operadores, o que é comum em unidades de alto risco. A estimativa usada por analistas e por quem acompanha operações é:
CORE: unidade enxuta, poucos operadores, alto nível de especialização, acionada quando o alvo é muito importante.
BOPE: algo em torno de 300 a 400 policiais especializados, número que oscila conforme saem turmas dos cursos e conforme o batalhão é exigido em operações longas.
Modelo que se espalhou pelo Brasil


Outro ponto forte do documentário é mostrar que o “jeito CORE” e o “jeito BOPE” viraram referência nacional.
Várias Polícias Civis criaram suas COREs ou estruturas equivalentes (Bahia, Pernambuco, Ceará, Pará, Santa Catarina, Goiás, Espírito Santo, Amazonas…).
Praticamente todas as Polícias Militares criaram seus BOPE, BOE, COE ou Batalhão de Operações Especiais, adaptando o modelo carioca.
CORE/BA (via SSP-BA): https://www.ssp.ba.gov.br
BOPE/PR: https://www.pm.pr.gov.br
Conclusão: duas missões, um mesmo problema
O resumo é simples, mas poderoso para fechar o artigo:
O BOPE representa o poder de fogo e a capacidade de entrada em área conflagrada, com permanência e controle de território.
A CORE representa a inteligência policial protegida, a força que garante que a delegacia consiga chegar ao alvo mesmo em áreas onde o Estado quase não entra.
O Rio manteve duas tropas de elite porque o problema é grande demais para uma só polícia resolver. Quando há refém, alvo de alto valor, operação com mídia e risco político, o Estado precisa ter mais de uma chave para abrir a mesma porta.
Se você produz conteúdo sobre segurança, emergência ou bastidores de operações, esse tema é ouro: permite vídeo comparativo, permite mapa animado mostrando as rotas, permite falar de legislação do uso da força e ainda dá gancho para matérias sobre expansão dessas tropas em outros estados.
E, claro, para quem quer ir além, vale assistir também comparativos como BOPE x SWAT, BOPE x GIGN e análises de operações em favelas, que normalmente são bem documentadas em portais como o g1 e o UOL Notícias.



